Não existe esponja para lavar o céu
Mas nunca poderias ensaboá-lo
E depois atirar-lhe baldes e baldes de mar
E pendurá-lo ao sol para secar
Faltaria sempre o pássaro em silêncio
Não existem métodos para tocar no céu
Mas ainda que te esticasses como uma palmeira
E conseguisses roçá-lo nos teus delírios
E soubesses por fim como é ao tacto
Faltaria sempre a nuvem de algodão
Não existe uma ponte para atravessar o céu
Mas ainda que conseguisses chegar à outra margem
À força de memória e prognósticos
E comprovasses que não é assim tão difícil
Faltaria sempre o pinheiro ao crepúsculo
E isso porque se trata de um céu que não é teu
Ainda que seja impetuoso e desgarrado
Em compensação quando chegar o que te pertence
Não vais querer lavá-lo, nem tocá-lo, nem atravessá-lo
E contudo estarão lá o pássaro e a nuvem e o pinheiro.
Mário Benedetti
5 comentários:
Um grande poeta.
O que é óptimo...
o céu e os seus mistérios....belo conjunto de texto e poema....
Óptima escolha. Gostei muito
Noite feliz. Um beijinho
Não conhecia, nem o poema, nem o autor.
Olhe que já há empresas especializadas em lavar o céu.
E... às vezes ficamos com a breve impressão de termos tocado o céu, mas afinal... era um infernosito de 3ª ou 4ª categoria. Que mania têm os sentidos de nos enganar.
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